Diogo Cerqueira: 'Somos muitas vezes mais que artistas, somos psicólogos'

Diogo Cerqueira, o elegido Portugal Country Winner, defendeu o seu trabalho no Revlon Style Masters Show 2017, que teve lugar no passado mês de Maio em Bruxelas, Bélgica. Falámos com o vencedor português que nos contou sobre a importância para um profissional de cabeleireiro participar em eventos deste género e a formação contínua que deve ter para o desenvolvimento da profissão. Diogo falou-nos ainda sobre a sua inspiração para a coleção que apresentou, o seu percurso profissional, tendências e os planos para o futuro.

Beauty Market: Podes falar-nos um pouco sobre a tua trajetória profissional até hoje?
Diogo Cerqueira: A minha carreira profissional tem sido bastante interessante porque consegui aliar duas grandes paixões na minha rotina de trabalho: moda e cabelos. A minha primeira formação é em design de moda. Entretanto, durante as produções para os desfiles e sessões fotográficas, descobri-me apaixonado pelo universo dos cabelos e decidi apostar neste caminho. Luto para ser dia após dia melhor profissional e destacar-me pela diferença. Comecei como ajudante, passei por alguns salões e já dei formação, mas é de facto o contacto com os clientes que me motiva e que estimula a minha criatividade!

B.M.: Porque decidiste participar no Style Master?
D.C.: É a minha segunda participação, mas esta teve obviamente um gostinho especial. Como disse no dia em que fui nomeado, é sempre bom desafiar os nossos limites e a nossa criatividade. Além disso, essas iniciativas são sempre muito boas para a nossa carreira, tanto a longo como a curto prazo, as próprias clientes do dia-a-dia ficam entusiasmadas por nós e o apoio de toda a gente que nos rodeia, clientes incluso, é muito importante, porque no final das contas todos temos a ganhar quando melhoramos.

B.M.: Consideras que participar num evento deste género é uma mais-valia para a tua carreira? Porquê?
D.C.: Claro que sim! Embora os desafios do dia-a-dia sejam importantes, este tipo de desafio está num outro patamar e quanto mais aprendemos melhor para nós enquanto profissionais, para os clientes e espaços onde trabalhamos. Tudo isto também nos motiva a chegar mais longe, o próximo desafio é estar entre os nove finalistas!

B.M.: Como foi a receção da convocatória como representante de Portugal?
D.C.: Foi emocionante. Quando do nada estamos a trabalhar normalmente e de repente chegam os representantes da Revlon com o troféu e as câmaras, sinceramente não se encontram palavras para descrever aquele momento. Ter o nosso trabalho reconhecido é fenomenal.

B.M.: Qual foi a tua inspiração para a coleção que apresentaste?
D.C.: Esta coleção contou com uma inspiração que já tinha em mente há muito tempo. Um tema forte e que conta com alguma crítica social, um tema que fala um pouco da sociedade que vivemos hoje em dia e das pessoas que tentam constantemente parecer o que não são em contraste com pessoas que a única coisa a que se podem agarrar é a sua fé. Pessoas que têm de se esconder atrás de alguma coisa, um manto de vergonha de assumir aquilo que na verdade são.
Tudo isto passou não só por um processo criativo da minha parte como também por parte da minha equipa.
O estilista Hugo Veiga criou todas as peças de vestuário especificamente para este trabalho, e o styling tem a assinatura de Daniel Vaz. A make up é de Dulce Monteiro e a modelo Catarina Barros também foi cuidadosamente escolhida pelas características delicadas e por possuir feições quase de santa.

B.M.: Como é o ambiente num concurso deste tipo? E como é a relação com os outros participantes?
D.C.: É sempre muito interessante. Toda a festa e envolvência são muito giras e meticulosamente organizadas. A festa ibérica, que acontece no dia anterior ao Style Masters show, e onde tanto o vencedor de Espanha como de Portugal são oficialmente premiados, tem um sabor especial.
Quanto à convivência com os outros participantes, este ano pareceu-me diferente e mais interessante pelo facto todos os country winners serem júris de uma categoria (best live execution) onde o vencedor foi o espanhol Rafael Boeno. Mas mesmo assim acho que era muito interessante se esse convívio fosse maior, pois no dia das festas não há grandes oportunidades.

B.M.: De onde vem a tua criatividade?
D.C.: Tudo no geral inspira-me, o facto de ter estudado inicialmente design de moda pode me ter ajudado a encontrar inspiração facilmente em quase tudo. Mas tenho de facto um interesse em tudo o que é antigo e tudo o que seja forte e chocante em simultâneo. Gosto da sensualidade clássica e aprecio muito mulheres fortes e extremamente femininas. Acho que a criatividade deve-se muito em observar aquilo que nos rodeia e que nos interessa e depois é só tentar, fazer e desfazer até chegarmos a algo que gostamos, seja forma, textura, cor...

B.M.: A rotina do salão ajuda na criatividade? Como?
D.C.: Ajuda em alguns pontos, cada vez mais as pessoas estão dispostas a arriscar e a mudar e isso é bom, embora não aconteça com tanta frequência como nós gostaríamos! Mas cada vez mais as clientes deixam-me criar e cofiam mais no meu trabalho.

B.M.: O que consideras que se deve ter em conta na hora de criar/desenhar uma coleção pela primeira vez? Que conselhos darias?
D.C.: É muito importante o planeamento de uma coleção deste género. Devemos começar por definir um tema, escolher uma equipa, desenhar cabelos, testar cabelos...as etapas são quase infinitas! Este tipo de trabalho requer muito de nós… mais do que muita gente pensa. Tudo tem de ser planeado ao mais pequeno detalhe. A escolha de uma boa equipa, a pesquisa e o teste de todos os cabelos na procura de novas técnicas é essencial.

B.M.: Como avalias o setor de cabeleireiro português? Na tua opinião, qual deveria ser o caminho a seguir?
D.C.: Acho que deveríamos ter mais iniciativas deste género, e deveriam haver associações que de facto fizessem algo pelos profissionais. Mas o principal está na mentalidade dos próprios cabeleireiros, mas isso é um assunto que daria pano para mangas.

B.M.: Consideras que se deveria valorizar o I+D (Investigação e Desenvolvimento) no setor de cabeleireiro?
D.C.: Sim, a evolução é sempre positiva e esta é uma área que está em constante evolução e mudança. Mas acho que deveria partir também do profissional. É importante que seja incutida nos profissionais a vontade de investigar e desenvolver, principalmente através de formações. Só no dia-a-dia de salão sabemos algumas necessidades tanto dos clientes como nossas para desenvolver um melhor trabalho diário.

B.M.: Até onde vão as novas tendências em corte, cor e textura para homens?
D.C.: A moda masculina está cada vez mais a destacar-se pela diferença, acho que não há nenhum limite para o que se usa ou se deixa de usar. Principalmente porque cada vez mais a moda segue uma tendência agénero. Por isso o principal é usar algo com que nos sintamos bem, o que faz com que automaticamente se use um pouco de tudo, e permita aos homens ousar mais, o que torna as tendências mais generalistas.

B.M.: Porque é que escolheste esta profissão? O que recordas do início do teu percurso?
D.C.: Esta profissão encantou-me pelo facto de, como já antes referi, estar em constante movimento e desenvolvimento, além da ligação à moda. Algo que também me encanta é o facto de poder mudar pessoas e principalmente fazer com que se sintam mais bonitas e seguras de si mesmas, em vários sentidos. Somos muitas das vezes mais do que artistas, somos psicólogos. Posteriormente, por ter familiares ligados à química, desenvolvi um gosto especial por tudo o que são trabalhos técnicos, principalmente cor, e gosto muito de desafiar os meus conhecimentos nesse sentido.

B.M.: Para concluir, quais são os teus próximos passos/projetos?
D.C.: Tenho diversos projetos muito interessantes para futuro. Faz parte da minha intenção voltar a participar no concurso e ser cada vez melhor. Brevemente irei lançar duas novas coleções, uma delas em parceria com grandes nomes da área a nível internacional. Recebi também alguns convites para dar formação e não só! Quero também fazer algumas formações no estrangeiro e fazer tudo o que estiver ao meu alcance para ser cada vez melhor.